quarta-feira, 17 de agosto de 2011

sabes quem é a pessoa que gosta mais de ti no mundo inteiro?

perguntei ontem ao K.
a mãe!
respondeu ele, sem uma única hesitação. 
ri-me e abanei a cabeça,
errado!
o pai?
perguntou-me ele, e de novo abanei a cabeça
errado...
esgotadas as duas possibilidades mais fortes, o K. ficou em silêncio, provavelmente pensando quem, para além do pai e da mãe, poderia gostar assim tanto dele. esperei que descobrisse a resposta, sem dizer nada, ao mesmo tempo que o imaginava a esgotar todas as outras possibilidades dentro da sua cabeça. ao fim de algum tempo, um pouco inseguro, o K. perguntou-me
sou eu?
já tinha feito este exercício com as minhas filhas mais novas e as duas me tinham dado as mesmas respostas
o pai e a mãe.
há uns tempos atrás, talvez lhes tivesse dito que estavam certíssimas - e a seguir enchia-as de beijos, para que não pudesse restar uma única dúvida. aliás, se quiser ser verdadeira, perco a conta às vezes que já disse a cada um dos meus quatro filhos, 
és a pessoa de quem gosto mais no mundo inteiro!
e só isso é a prova de que lhes estava a mentir, a não ser que quatro pessoas diferentes possam ser a mesma pessoa de quem gosto mais no mundo inteiro.
se, por outro lado, disser à minha mãe que descobri que as pessoas de quem gosto mais no mundo inteiro, afinal, não são os meus filhos, tenho a certeza de que me irá criticar
és uma ingrata!
e desenrolar um breve discurso sobre a qualidade das mães que se dedicam aos filhos, que vivem por eles e para eles e, na maioria das vezes, com sacrifícios, e as outras, assim mais tipo eu, que vendo bem até sempre fui um bocado desaparafusada e que com o tempo me tenho vindo a tornar numa grande egoísta. e depois os meus filhos
coitados!
diz ela, e suspira
andam aí ao deus dará!
pois eu gostava que a minha mãe, quando eu era pequena, me tivesse explicado que a pessoa que mais gostava de mim no mundo inteiro só podia ser eu. por mais que também ela gostasse, claro!, e o meu pai, e a minha avó, e o meu avô, e as minhas tias e por aí fora. mas nunca é assim e não posso dizer que a minha infância tenha sido a excepção. e então é assim que todos crescemos, com esta crença danada que nos jura a pés juntos que, para estarmos vivos e de saúde, não nos pode faltar o amor dos outros. e se houver alguém que nos queira amar mais do que si próprio, está montado o cenário de dependência para todos os filmes futuros.
habituados a ter alguém que goste, acima de tudo, de nós, vamos esforçar-nos o mais possível por lhe agradar e fazer o que seja preciso para lhe chamar a atenção. o objectivo é que goste de nós, que nos valide, nos apaparique e nos faça sentir importantes, nem que para isso passemos a vida inteira a fingir não ser o que somos: perfeitamente imperfeitos.

e lembro-me daquele anúncio, não sei se de um leite ou de um iogurte, em que uma loira meia despida - estão sempre meias despidas, as loiras que fazem anúncios - olhava para a câmara e perguntava
se eu não gostar de mim, quem gostará?
e é isso então que quero mostrar aos meus filhos: o egoísmo de amar-me mais a mim do que a eles, de ser a pessoa que mais gosta de mim no mundo inteiro. e desejo do fundo da alma que sejam tão egoístas, tão egoístas que sintam o mesmo em relação a eles próprios.


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