segunda-feira, 15 de agosto de 2011

the wall

disseste
há um muro intransponível e tu ficaste desse lado.
senti-o nas tuas mãos que me afastavam, um muro compacto, realmente intransponível, muito alto e, mesmo assim, ousei trepá-lo, desfazê-lo, derrubá-lo pela força, forçá-lo pela insistência. mas não cedeu um só milímetro, nem sequer quando troquei força por festas, era mesmo muito alto e muito denso e muito largo. e vim para casa e não dormi a noite inteira, com o peso desse muro entre nós dois. nenhuma frincha por onde fosse possível começar a esboroar-se, nenhuma fresta por onde o ar circulasse, ficámos a atirar palavras como quem atira pedras e lembrei-me dos murais do facebook e de como há tanto tempo mantemos esta intifada. palavras que atiramos pelo ar na ilusão de que estamos a atingir o outro lado, mas que fazem ricochete e nos acertam nos lugares que menos queremos. nos lugares onde dói mais.
e então só fui dormir quando já havia luz e a manhã se espraiava sobre a relva e reparei que não havia muro nenhum, apenas pássaros acordados nas roseiras, os figos que caíam, maduros e peganhentos, sobre o pátio, as buganvílias enroscadas na parede lá do fundo, e as coelhas, indiferentes à insónia que me calava as visões, de tanto me inchar as pálpebras com o sal dos pensamentos.
e fui devagar para a cama. subi as escadas e em nenhum dos dez degraus vi um muro intransponível e pude assim subi-las todas e deitar-me e imaginar que já era larga e branca, a cama nova que em breve irei comprar, e sonhei que voltavamos à praia onde caçadores furtivos roubam as estrelas dos sonhos para as secar longe do mar sem que eu possa fazer nada para os deter. sem que eu possa fazer nada para transpor a barricada atrás da qual tu te defendes. sem que eu possa fazer nada a não ser ver onde eu própria ergo os muros que me separam de mim mesma, trepar descalça até lá acima e ver que o céu, afinal, não tem paredes.



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