segunda-feira, 31 de outubro de 2011

noite das bruxas


e eu, que sempre vivi guiada por fadas, abro mão da magia e dos pós de encantar e mergulho. 
acendo o fogo e mergulho, para que me arda o passado e se queimem todas as feridas que teimo em abrir, de cada vez que acredito que sou este corpo de sangue e de carne.
diziam os celtas que dois deuses gémeos reinavam nas duas metades do ano. ao deus luminoso, cabia a metade do ano que ia do fim do inverno até à metade do verão, ficando o resto do ano entregue ao deus gémeo - o da escuridão. 
longe de ser um deus 'mau', o que reina a partir desta noite não representa mais do que o declínio da natureza, que em paz adormece e se retira para dentro da terra, de forma a poder renascer quando, de novo, o deus luminoso vier tomar conta da sua metade do tempo.
à semelhança das árvores, deixo que as folhas me caiam, sem temer a nudez nem o frio do inverno. deixo que a terra me acolha numa humidade de ventre materno, que os planos se cruzem sem véus e que do outro lado me atendam as preces. que o fogo consuma tudo o que já não me serve e que a chuva abençoe todas as minhas entregas. condenso o silêncio nos dedos, que entoam canções de embalar à medida que os pouso nas teclas, e deixo que os dons se recolham, mas não que adormeçam. 
a grande roda da vida não pára quando tudo mergulha na terra e se aquieta, há no ventre do fogo uma chama que chama o meu nome e que as bençãos da chuva, ao invés de apagarem, tornam ainda mais claro, quando o pronuncio dentro do peito, em silêncio *

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